sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Escutas Hertzianas
Prémios a Saramago por tudo e por nada


Diz-se que quem viaja uma vez na primeira classe nunca mais quer saber da turística para nada. José Saramago é um bom exemplo. Depois de ter ganho o Nobel da Literatura, em 1998, parece que os outros premiozinhos que vão aparecendo até cheiram a chulé. E com razão torce o nariz, já que de repente virou consenso em Portugal que qualquer prémio que se preze tem de ser atribuído a "esse grande escritor e anti-fascista".

Foi assim numa gala ocorrida no final do mês passado, em que o Rádio Clube Português e o jornal Metro distinguiram as personalidades que marcaram o ano de 2007 em várias áreas. No Desporto, ganhou a triatleta Vanessa Fernandes; na Cultura, a fadista Mariza; e por aí afora... Até que chegou a hora de anunciar o Grande Prémio, que teoricamente seria para a personagem que mais marcou o ano de 2007. E quem foi o escolhido? Isso mesmo, o autor de "Memorial do Convento", "Ensaio sobre a Cegueira" e outros grande livros! Mas isto num ano em que a única obra que publicou foi o nada de especial "O Ano de 1993", um livro de poemas antigos que estavam esquecidos nalguma gaveta.

A seguir transcrevemos a fabulosa conversa que os apresentadores Teresa Gonçalves (TG) e Aurélio Gomes (AG) tiveram com José Saramago (JS), este ao telefone directamente de Lanzarote, para a grande gala, conversa salpicada pelos risos da Plateia (P). Curiosamente, estas partes foram cortadas no resumo que a rádio fez em diferido na manhã seguinte - deixaram apenas as partes em que ele diz "muito obrigado" e essas coisas. (Conas!)

AG: Primeiro, antes de mais, parabéns por esta homenagem que o Rádio Clube e o jornal Metro lhe prestam.
JS: Muito obrigado(...) Agradeço muito. Não sei que homenagem é, não sei quais os motívos dessa homenagem, mas as homenagens aceitam-se e agradecem-se, sobretudo quando vêm de boa gente (...)
TG: Queria perguntar-lhe qual o significado que esta homenagem tem para si...
JS: Vamos lá ver, em primeiro lugar têm de dizer-me porque é que me fazem esta homenagem, e até agora ninguém mo disse...
P: (risos)
TG: Porque é merecida, seguramente.
JS: Mas é merecida por alguma razão (...). O Rádio Clube (...) decide nesta altura homenagear-me, mas digam-me porquê.
P: (risos)
JS: ... Amanhã encontro um amigo na rua e digo-lhe que fui homenageado pelo Rádio Clube Português. Ele é capaz de fazer uma cara de estranheza e perguntar porquê. Digam lá: o Rádio Clube porque é que me homenageia?
AG: Insistimos naquilo que lhe dizemos: porque nos merece toda a nossa maior admiração.
JS: Eh, bom, enfim, é uma razão, pronto, e não se fala mais nisso.
P: (risos e aplausos)
TG: Não acha que é suficientemente válida? (risinho)
JS: Eu não posso ser juiz em causa própria. São vocês quem considerou que essa distinção tinha justificação na minha pessoa e eu agradeço infinitamente... (...) Sei que se trata de um quadro, não sei quem é o autor...
AG: Francisco Vidal, já agora...
JS: Como?
AG: É um jovem artista plástico chamado Francisco Vidal.
JS: Francisco Vidal... e ele é donde, de Lisboa, do Porto, de onde é que é?
AG: Suponho que é lisboeta, mas não vou jurar...

1 comentário:

Anónimo disse...

Genial, oh Vostra. Portugal do século XXI no seu melhor.