Se um almirante sugerir a um grupo de passageiros que se
atire borda fora, só para ver se o barco se torna mais fácil de
controlar, perde um bocadinho de prestígio. Mas o que é inaceitável
noutros ofícios, em política é bom senso
Examinemos os seguintes casos, ocorridos na mesma semana:
um comandante da polícia desejou que alguns concidadãos tivessem
"relações sexuais incríveis" e perdeu o seu emprego; um
primeiro-ministro desejou que alguns concidadãos emigrassem e manteve o
seu. Este é um país em que desejar felicidade (ainda por cima através de
relações sexuais incríveis, que é a forma mais alta de felicidade) dá
despedimento ou, pelo menos, processos disciplinares e outras chatices.
Acabei por não saber ao certo o que aconteceu ao comandante porque tenho andado ocupado a tentar manter relações sexuais incríveis, como é próprio desta época festiva. Mas o facto permanece: desejar felicidades, em Portugal, causa mais engulhos do que desejar transtornos.
Vamos por partes: o comandante da polícia municipal de Coimbra enviou um e-mail de boas festas aos funcionários da autarquia mas, dizem os jornais, enganou-se no anexo. Aqui está o primeiro elemento estranho da história.
O homem não se enganou no anexo, enganou-se no e-mail. O anexo era a única coisa interessante daquela peça de correspondência, uma vez que continha o desejo de "relações sexuais incríveis" e fotografias de senhoras capazes de as proporcionar. João Paulo Barbosa de Melo, presidente da autarquia de Coimbra, instaurou um infame processo disciplinar ao comandante, pretextando que "a mensagem tinha conteúdos que não se coadunavam com o prestígio daquela câmara". Ora, trata-se de uma alegação falsa. Sou um velho apreciador de conteúdos que não se coadunam com prestígios, e o mail do comandante não os exibia. Nenhuma das senhoras está completamente despida e a própria expressão "relações sexuais incríveis " é repugnantemente prestigiosa. Não é o tipo de coisa que se deseje numa linguagem tão pouco vernacular. O desejo está expresso de um modo tão formal que quase tira a vontade de o concretizar, como se o comandante tivesse dito: "Espero que desfrutes de sensações extremamente agradáveis ao nível da genitália." Não diz. No entanto, não é por isso que o pobre polícia está a ser processado, mas sim porque o presidente da Câmara teme que o seu prestígio esteja posto em causa. E ai de quem se interponha entre um autarca e o prestígio.
Por outro lado, o primeiro-ministro também formulou um desejo de Natal: que os professores abandonem a família, os amigos e a sua vida em geral e emigrem.
Ainda assim, não atentou contra o prestígio de qualquer instituição. Se um almirante sugerir a um grupo de passageiros que se atire borda fora, só para ver se o barco se torna mais fácil de controlar, perde um bocadinho de prestígio. Mas o que é inaceitável noutros ofícios, em política é bom senso. Já era conhecida a sugestão que os racistas dão aos estrangeiros: "Vai para a tua terra." Agora, o primeiro-ministro tem uma recomendação para os nativos: "Sai da tua terra." Esta terra, afinal, para quem será?
Acabei por não saber ao certo o que aconteceu ao comandante porque tenho andado ocupado a tentar manter relações sexuais incríveis, como é próprio desta época festiva. Mas o facto permanece: desejar felicidades, em Portugal, causa mais engulhos do que desejar transtornos.
Vamos por partes: o comandante da polícia municipal de Coimbra enviou um e-mail de boas festas aos funcionários da autarquia mas, dizem os jornais, enganou-se no anexo. Aqui está o primeiro elemento estranho da história.
O homem não se enganou no anexo, enganou-se no e-mail. O anexo era a única coisa interessante daquela peça de correspondência, uma vez que continha o desejo de "relações sexuais incríveis" e fotografias de senhoras capazes de as proporcionar. João Paulo Barbosa de Melo, presidente da autarquia de Coimbra, instaurou um infame processo disciplinar ao comandante, pretextando que "a mensagem tinha conteúdos que não se coadunavam com o prestígio daquela câmara". Ora, trata-se de uma alegação falsa. Sou um velho apreciador de conteúdos que não se coadunam com prestígios, e o mail do comandante não os exibia. Nenhuma das senhoras está completamente despida e a própria expressão "relações sexuais incríveis " é repugnantemente prestigiosa. Não é o tipo de coisa que se deseje numa linguagem tão pouco vernacular. O desejo está expresso de um modo tão formal que quase tira a vontade de o concretizar, como se o comandante tivesse dito: "Espero que desfrutes de sensações extremamente agradáveis ao nível da genitália." Não diz. No entanto, não é por isso que o pobre polícia está a ser processado, mas sim porque o presidente da Câmara teme que o seu prestígio esteja posto em causa. E ai de quem se interponha entre um autarca e o prestígio.
Por outro lado, o primeiro-ministro também formulou um desejo de Natal: que os professores abandonem a família, os amigos e a sua vida em geral e emigrem.
Ainda assim, não atentou contra o prestígio de qualquer instituição. Se um almirante sugerir a um grupo de passageiros que se atire borda fora, só para ver se o barco se torna mais fácil de controlar, perde um bocadinho de prestígio. Mas o que é inaceitável noutros ofícios, em política é bom senso. Já era conhecida a sugestão que os racistas dão aos estrangeiros: "Vai para a tua terra." Agora, o primeiro-ministro tem uma recomendação para os nativos: "Sai da tua terra." Esta terra, afinal, para quem será?
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